O Último Tango em Paris (1972)

Skribita de Filipe Manuel Neto je Aprilo 28 2018

O lado mais feio da sexualidade.

Este filme, basicamente e de forma simples, gira em torno de um homem e uma mulher que, embora permaneçam anónimos, mantêm encontros sexuais que acabam por se desenvolvendo dramaticamente até ao ponto de ruptura. Ele é viúvo e sofre com isso, ela está noiva mas tem dúvidas que se tornam mais intensas à medida que o envolvimento deles aumenta. Ele parece amá-la e desprezá-la ao mesmo tempo. Ela submete-se, aceita ser tratada como um objecto, mas isso torna-se cada vez mais insuficiente. A cena antológica de violação anal pode ser, para muitos, o momento mais chocante e repugnante do filme, que aborda assuntos quase tabu para a época, como a crise da meia-idade, a dor da viuvez, os tabus sexuais, os traumas psicológicos, a traição conjugal, o abuso sexual e outros.

Os dois actores principais foram Marlon Brando e Maria Schneider, e ambos alcançaram o estrelato e fizeram aqui (principalmente ela) uma de suas obras cinematográficas mais aclamadas. No entanto, nunca pareceram muito gratos a Bernardo Bertolucci, o director, pois também foram fortemente estigmatizados pela controvérsia em torno do filme. Nalgumas versões dos acontecimentos, chegaram até a lamentar fazer o filme. Pessoalmente, eu entendo os sentimentos dos actores, eu teria recusado o trabalho, mas sou o primeiro a considerar que foi um acto de coragem, loucura e talento aceitar tais papéis.

Apesar da controvérsia e falta de escrúpulos do director para com o seu elenco, há aqui laivos de genialidade: a cinematografia é linda e encaixa-se perfeitamente no ambiente, que oscila entre o sedutor, o proibido e o ameaçador. O erotismo e a violência psicológica unem-se muito fortemente, em cenas que são, ao mesmo tempo, provocantes, perturbadoras e feias. O sexo não é apenas um acto íntimo entre duas pessoas mas um acto de domínio de um indivíduo sobre o outro, um refúgio psicológico e uma esperança de algo mais, que nunca chega.

Para mim, este filme é paradoxal. Foi lindamente filmado e feito mas aborda temas difíceis de digerir e que não são para todos, na minha opinião. Bernardo Bertolucci é um dos directores que menos aprecio. Reconheço-lhe a sua genialidade e brilhantismo técnico, mas também a dureza dos temas que prefere e a crueza com que trata os outros profissionais, particularmente os actores. De facto, boa parte do cinema italiano tem esse problema: é duro, é perturbador, gosta de mostrar a realidade mais dura e nas cores mais fortes, de mostrar coisas feias que nos repugnam. Este filme é um filme que eu não gosto, mas é poderoso e é impossível ficar-lhe indiferente.