Papillon (1973)

Escrita por Filipe Manuel Neto em 10 abril 2024

Um filme clássico com uma história notável e grandes actores.

Este é um trabalho que quase toda a gente recorda se o tema são filmes sobre o ambiente prisional. É um clássico que nos leva para um universo de dor, sofrimento, privação e luta contra a opressão, solidamente baseado num livro algo autobiográfico de Henri Charriere, chamado Papillon, um francês que esteve preso por décadas na colónia penal da Guiana Francesa e fez um livro que devia ser de memórias, mas que está tão cheio de invenções que merece ser considerado como ficção inspirada em bases reais. Claro, a questão pouco importa para o filme: esqueçamos o homem e foquemo-nos na personagem, seu alter-ego.

Dirigido por Franklin J. Schaffner e lançado em 1973, o filme foi filmado em Espanha e no Havai. E tendo em conta que a prisão real estava ao abandono, foi criado um cenário fiel na Jamaica, surgindo nos créditos finais alguns planos filmados no local verdadeiro. Uma nota interessante: precisando de um local de filmagem equatorial, a produção achou boa ideia ir para um país pobre, famoso pelas suas drogas leves, em plenos anos 70. Não é, portanto, surpreendente que os trabalhos na Jamaica tenham sido marcados por roubos e pilhagens, e por uma extraordinária abundância de boa maconha. Até o director aderiu e experimentou a substância! Além da boa concepção de cenários, figurinos e adereços, e de uma cinematografia inspirada e elegante, o filme conta com uma banda sonora muito bem feita, da autoria de Jerry Goldsmith, e que vale a pena escutar e valorizar por si só.

Com cerca de duas horas e meia, o filme foca-se bastante no retracto das más condições daquela colónia penal enorme, e dos maus tractos a que os presidiários se viam sujeitos. Eu penso que isso contribuiu muito para o sucesso que o filme teve nas bilheteiras: no rescaldo de protestos recentes, do Maio de 68, da Revolução Sexual e de movimentos pela paz, um filme onde um homem sozinho e persistente enfrenta todo um sistema de opressão e violência está fadado ao sucesso. Muita gente se revia no pensamento e atitude daquela personagem. Os críticos especializados, porém, não ficaram nada convencidos, e teceram duros comentários ao filme. Pouco depois, na bizarra cerimónia dos Óscares de 1974, o filme foi largamente ignorado, perdendo a única estatueta para a qual havia sido nomeado (Melhor Banda Sonora Original Dramática). Mas considerando a maneira como persistiu, venceu o teste do tempo e permanece popular, talvez os críticos e os juízes dos Óscares estivessem todos enganados.

Não se pode, no entanto, atribuir o sucesso deste filme apenas a uma boa história lançada num momento propício, e convincentemente contada e encenada. Steve McQueen é uma peça-chave do sucesso, graças a uma interpretação dramática incrível, uma das melhores da sua carreira artística. O actor consegue expressar, no rosto e nos maneirismos, a dor e a tenacidade da personagem que encarna, e empenha-se inteiramente no que está a fazer. Ao seu lado estava também Dustin Hoffman, num trabalho muito interessante e elegante a que o actor correspondeu inteiramente. Num patamar muito inferior, o filme conta com as contribuições positivas de Woodrow Parfrey, Don Gordon, Ratna Assan e Val Avery.